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sábado, 25 de janeiro de 2014

Análise Retrô: Box Of Secrets - Blood Red Shoes (2008)

Existe uma necessidade para o mercado de hoje: o primor técnico. Há uma ânsia da crítica especializada de categorizar as obras por suas características técnicas, tais como, qualidade da produção, qualidade instrumental, qualidade harmônica e assim por diante. Se um trabalho se enquadra nos padrões protocolados de qualidade e inovação, eles são aclamados, do contrário são menosprezados.

Os clássicos, possuem qualidade técnica invejável, Kate Bush, Sinead O' Connor, David Bowie, porém, além de apuro técnico invejável tais artistas possuíam algo que os diferenciava: espírito. Mas e quando um artista só tem espírito?


Blood Red Shoes, uma dupla britânica, formada em 2004 por Steven Ansell e Lara-Mary Carter, não possuem grande qualidade técnica. Steven não é um baterista excelente (mesmo em momentos que não divide a bateria com os vocais) e Lara-Mary também não é uma excelente guitarrista. Mas o que chama atenção na dupla é o espírito. E isso torna o duo inglês muito semelhante ao duo americano The White Stripes (apesar de o Jack White ser um grande guitarrista e pianista). Porém, somente em espírito as duplas são comparáveis, pois musicalmente  os dois são muito diferentes.

As duas bandas se diferenciam em um detalhe: enquanto The White Stripes segue uma linha mais experimental, Blood Red Shoes é tradicional. São raras as músicas do duo britânico que incluam outros instrumentos que não a guitarra e a bateria, aliás, no álbum de nossa análise é somente esses os instrumentos utilizados e são suficientes para garantir vigor.

O cd é rápido, visceral, sem vírgulas. Gosto de comparar esse cd com uma maratona, onde os atletas correm, e dispõe durante a corrida de pontos de distribuição de água, porém, mesmo nesses pontos nunca param de correr. É assim que vejo Box Of Secrets. As músicas não dão tempo para respirar, porém, nunca se tornam sufocantes e até as mais lentinhas como "This is not fot You" não dão trégua.

Mas o cd inicia-se com "Doesn't Matter Much", que é exemplo também de música lentinha, mas nem tanto e  é como a largada da maratona, é um momento de concentração até o grande memento.  A música tem tom de conselho: seja quem você quiser ser e encontre razões para viver, que torce para que o filho não se torne aquilo que ele não é. E as letras são realmente minimalistas, aliás, a banda deixa bem claro, não se importe com as letras e sim com o som. Muito porém as letras parecerem criar uma história fragmentada. Impressão que fica nas letras das música "You Bring Me Down" e "Try Harder". Portanto, a caixa dos segredos pode sim trazer de fato o segredo na soma das letras. Veja que algumas letras ecoam como pistas:

" We´ll take some measurements and work it out with the sums"

E essa dúvida de se há um segredo ou não para ser desvendado torna o cd algo realmente único. E as somas nas letras tornam tudo cheio de sentido. Como um grande protesto à mídia, aos protocolos sociais. Sim, isso é muito punk. E o pulsar das letras que parecem gritadas de um megafone para as pessoas na rua dão um toque de personalidade a mais. O punk-post rock da banda é de altíssima qualidade sim, porém, assim como The White Stripes ou Sex Pistols, desprovido de técnica. E o álbum segue sua constante e desesperadora e enigmática maratona com "Say Something, Say Anything" com um dos melhores refrões do disco e "I Wish I was Someone Better" que te convida a chacoalhar incessantemente a cabeça com guitarras rápidas e desesperadas!

Se lembram do copo d'água? Pois é, "Take the Weight" é a primeira dos pontos e a música com seus pouco mais de quatro minutos é exatamente isso, um momento para respirar, porém o refrão nos lembra que ainda estamos numa corrida, e as críticas ainda são disparadas, contra o capitalismo, aos modismos, aos meios de comunicação. "A.D.H.D" (sigla em inglês para a mal de déficit de atenção causada por hiperatividade) talvez seja a resposta para a maratona:

"Now, now, now, now, boy!
Hearing everything so faster!...

 Now, now, now, now, boy!
Giving myself a heart attack"



"This is Not for You" reforça minha teoria, e a bateria bate e o rock se intensifica. Tudo volta a bater com força total, e sim, as músicas continuam animando, porém parece estar começando a cansar e aos poucos, após o desgaste físico, os atletas começam a economizar energia para poderem concluir a exaustiva prova. E lá vem mais um copo d'água "It's Getting Boring by the Sea" segue o mesmo padrão de letra minimalista e cheia de críticas a vida calma de uma cidade, então dizem apaixonados em coro que precisam correr como nunca e mudar o cenário (preciso dizer algo?). E a parcela de hard rock do cd fica para "Forgive Nothing" mais harmonizada, porém não menos veloz. Para finalizar a maratona "Hope You´re Holding Up" e assim o merecido descanso.

Blood Red Shoes não é inovador, não são os melhores instrumentistas. Porém eles cantam (gritam muitas vezes) aquilo que eles sentem, sem se importar com letras de métricas regulares e protocoladas. Não se intimide com o ritmo acelerado das canções e se divirta no mais verdadeiro rock, porque essa é a essência do rock: as vozes de protesto, de insatisfação, do descompromisso, mas ainda assim, do divertimento, da juventude. Portanto, tratem de ir atrás de conhecer esse ótimo trabalho.

Ouça sem parar:

"I Wish I Was Someone Better" / "You Bring Me Down" / "Try Harder" / "A.D.H.D"

Ficha técnica:
Gravadora: Mercury Records
Gênero: Punk Rock/ Post Rock/ Hard Rock
Ano: 2008
Nota: 8,75

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